SUMÁRIO EXECUTIVO
A presente orientação jurídica tem por objetivo analisar a sentença proferida pela Excelentíssima Juíza Arklenya Xeilha Souza da Silva Pereira, da 8ª Vara Cível da Comarca de Natal, que extinguiu o processo sem resolução do mérito por ilegitimidade passiva da ré Erika de Souza Felix Felipe, e apresentar estratégia recursal fundamentada em exceções consolidadas pela doutrina e jurisprudência pátria que permitem a responsabilização direta do agente público em casos específicos de abuso de poder e conduta irregular.
A análise demonstrará que, embora o Supremo Tribunal Federal tenha fixado entendimento no Tema 940 de Repercussão Geral estabelecendo a regra geral de responsabilização do ente público, existem exceções bem delineadas pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e doutrina especializada que autorizam a responsabilização direta do agente público quando este age com abuso de poder, de forma irregular ou estranha ao rol de suas atribuições funcionais.
I. ANÁLISE DA DECISÃO RECORRIDA
A sentença proferida em 11 de julho de 2025 fundamentou-se exclusivamente no artigo 37, §6º da Constituição Federal e na jurisprudência consolidada pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 1.027.633/SP, julgado sob a sistemática da repercussão geral (Tema 940), que estabeleceu a seguinte tese: “A teor do disposto no art. 37, § 6º, da Constituição Federal, a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado prestadora de serviço público, sendo parte ilegítima para a ação o autor do ato, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.
A magistrada de primeiro grau, ao aplicar de forma literal e absoluta o entendimento do Tema 940, deixou de considerar as nuances e exceções que a própria jurisprudência superior tem reconhecido em casos específicos onde o agente público age com abuso de poder ou de forma irregular, desvinculando-se da Administração Pública. Esta aplicação mecânica da jurisprudência, sem a devida análise das particularidades do caso concreto, constitui erro de direito que autoriza a reforma da decisão através do recurso de apelação.
O caso em análise apresenta características específicas que o enquadram nas exceções reconhecidas pela doutrina e jurisprudência, especialmente no que se refere ao alegado abuso de poder praticado pela ré no exercício de suas funções de diretora escolar, configurando conduta irregular e estranha ao rol normal de suas atribuições funcionais. Os fatos narrados na exordial indicam a prática de atos persecutórios, constrangimentos e imposição de condições laborais inadequadas que extrapolam os limites do poder diretivo regular, caracterizando abuso de autoridade e desvio de finalidade.
A sentença, ao não analisar a natureza específica dos atos imputados à ré, incorreu em julgamento superficial que não considerou a distinção fundamental entre atos praticados no exercício regular das funções públicas e atos praticados com abuso de poder ou de forma irregular. Esta distinção é essencial para a correta aplicação do instituto da responsabilidade civil e encontra amparo tanto na doutrina quanto na jurisprudência dos tribunais superiores.
II. FUNDAMENTOS JURÍDICOS PARA A RESPONSABILIZAÇÃO DIRETA
2.1. Exceções Consolidadas pela Doutrina Especializada
A doutrina jurídica brasileira, através de renomados autores especialistas em Direito Administrativo e Responsabilidade Civil, tem reconhecido que a regra geral estabelecida pelo artigo 37, §6º da Constituição Federal não é absoluta, admitindo exceções em casos específicos onde o agente público age com abuso de poder ou de forma irregular.
Maria Júlia Marcondes de Moura e Souza, em artigo científico publicado na Revista Cognitio Juris [1], destaca que “evidente, portanto, que em agindo com abuso de poder, ainda que no exercício de sua função pública, o agente se desvincula da Administração, pois tanto em caso de excesso quanto em casa de desvio, agirá movido por razões alheias ao regime de direito público”. Esta desvinculação da Administração é o fundamento teórico que autoriza a responsabilização direta do agente público em casos de abuso de poder.
O abuso de poder, conforme leciona a doutrina, manifesta-se através de duas modalidades principais: o desvio de poder e o excesso de poder. O desvio de poder ocorre quando o agente atua fora da finalidade legal, enquanto o excesso de poder caracteriza-se quando o agente extrapola sua competência legal. Em ambos os casos, há uma desvinculação do agente em relação à Administração Pública, pois seus atos não mais se enquadram no exercício regular das funções públicas.
A distinção entre abuso de poder e exercício regular de direito é fundamental para a correta aplicação do instituto da responsabilidade civil. Conforme ensina Rubens Limongi França, citado no artigo supracitado, “o abuso de direito consiste em um ato jurídico de objeto lícito, mas cujo exercício, levado a efeito sem a devida regularidade, acarreta um resultado que se considera ilícito” [1]. Esta conceituação demonstra que nem todo ato praticado por agente público no exercício de suas funções está protegido pela responsabilidade objetiva do Estado, especialmente quando há abuso ou irregularidade na conduta.
2.2. Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
O Superior Tribunal de Justiça, em julgamento paradigmático no caso Lula vs. Dellagnol, estabeleceu importante precedente que reconhece exceções à regra geral do Tema 940 do STF. Conforme destacado por Romualdo Baptista dos Santos [2], o STJ fixou entendimento no sentido de que:
“Nas hipóteses em que a conduta da qual deriva o dano consistir no exercício das funções públicas regulares, do agir funcional, (…) a demanda, necessariamente, será ajuizada em face do Estado, que, em ação regressiva, poderá acionar o agente público. Por outro lado, (…) nas situações em que o dano (…) é provocado por conduta irregular do agente público, compreendendo-se como ‘irregular’ conduta estranha ao rol das atribuições funcionais, (…) a ação com desígnio indenizatório, (…) pode ser ajuizada em face do agente.”
Este precedente estabelece critério objetivo para a distinção entre atos funcionais regulares e atos irregulares, sendo que apenas os primeiros estão protegidos pela responsabilidade objetiva do Estado. Quando o agente público pratica atos irregulares ou estranhos ao rol de suas atribuições funcionais, não há fundamento jurídico para incluir o ente estatal na demanda, devendo a responsabilização recair diretamente sobre o agente causador do dano.
O fundamento desta exceção reside no fato de que “não pertencendo o atuar abusivo ao rol dos atos funcionais, não se reconhece no ordenamento jurídico fundamento capaz de legitimar a inclusão do ente estatal na demanda” [2]. Esta ratio decidendi demonstra que a responsabilidade objetiva do Estado não é um escudo absoluto para proteger agentes públicos que agem com abuso de poder ou de forma irregular.
2.3. Aplicação da Teoria da Desvinculação da Administração
A teoria da desvinculação da Administração, amplamente aceita pela doutrina e jurisprudência, estabelece que quando o agente público age com abuso de poder ou de forma irregular, ele se desvincula da Administração Pública, não podendo esta ser responsabilizada pelos danos causados. Esta teoria encontra fundamento no princípio da legalidade administrativa, que exige que todos os atos da Administração Pública sejam praticados em conformidade com a lei e dentro dos limites da competência legal.
Quando o agente público extrapola os limites de sua competência ou age com desvio de finalidade, ele não mais atua em nome da Administração, mas sim em interesse próprio ou alheio ao interesse público. Nestes casos, a responsabilização deve recair diretamente sobre o agente, pois não há nexo de causalidade entre a atividade administrativa regular e o dano causado.
Esta teoria é especialmente aplicável em casos de assédio moral e perseguição no ambiente de trabalho, onde o agente público utiliza sua posição hierárquica para fins estranhos ao interesse público, configurando abuso de poder e desvio de finalidade. A jurisprudência tem reconhecido que tais condutas não se enquadram no exercício regular das funções públicas, autorizando a responsabilização direta do agente causador do dano.
III. JURISPRUDÊNCIA ESPECÍFICA SOBRE ASSÉDIO MORAL EM AMBIENTE ESCOLAR
3.1. Precedentes dos Tribunais de Justiça
A jurisprudência dos Tribunais de Justiça estaduais tem consolidado entendimento favorável à responsabilização direta de diretores escolares em casos de assédio moral e abuso de poder. Esta linha jurisprudencial reconhece que condutas abusivas praticadas por superiores hierárquicos no ambiente escolar configuram atos estranhos ao exercício regular das funções públicas, autorizando a responsabilização pessoal do agente.
O Tribunal de Justiça do Paraná, em julgamento de Recurso Inominado, estabeleceu precedente importante ao decidir que “é faculdade da autora promover a demanda em face do servidor, do estado ou de ambos, no livre exercício do seu direito de ação” [3]. O acórdão reconheceu que “configura o assédio moral a exposição da professora a situações humilhantes e constrangedoras, no exercício de suas funções educacionais, por meio de comportamentos, palavras, atos, gestos e gritos, praticado durante o poder diretivo escolar” [3].
Este precedente é especialmente relevante para o caso em análise, pois reconhece expressamente que a vítima de assédio moral praticado por agente público tem a faculdade de escolher entre processar o ente público ou o agente causador do dano. Esta opção processual encontra fundamento na natureza irregular da conduta abusiva, que se desvincula do exercício regular das funções públicas.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais, em caso envolvendo professora readaptada vítima de assédio moral praticado por diretora de unidade escolar, decidiu que “conduta abusiva perpetrada por superior hierárquico (diretora da unidade escolar), de forma reiterada” caracteriza “tratamento dispensado à autora que violou sua dignidade constitucionalmente assegurada, caracterizando a responsabilidade subjetiva civil do Estado e o dever de indenizar” [4]. Embora este julgado tenha responsabilizado o Estado, reconheceu expressamente a natureza abusiva da conduta da diretora, o que fundamenta a possibilidade de responsabilização direta em casos similares.
3.2. Elementos Caracterizadores do Abuso de Poder no Ambiente Escolar
A jurisprudência tem identificado elementos específicos que caracterizam o abuso de poder e o assédio moral no ambiente escolar, distinguindo-os do exercício regular do poder diretivo. Estes elementos incluem: exposição a situações humilhantes e constrangedoras; comportamentos, palavras, atos e gestos inadequados; conduta reiterada de superior hierárquico; violação da dignidade constitucionalmente assegurada; e extrapolação dos limites do poder diretivo regular.
O Tribunal de Justiça do Paraná, em outro precedente relevante, destacou que “a avaliação da qualidade do trabalho e as exigências no cumprimento das obrigações próprias do cargo são válidas e cabíveis quando correlatas à eficiência exigida da Administração Pública e empreendidas com polidez, respeito à intimidade e à legalidade, sem abuso de poder e observados os limites da razoabilidade” [5]. Esta decisão estabelece critério objetivo para distinguir entre o exercício regular do poder diretivo e o abuso de poder.
Quando o superior hierárquico extrapola os limites da razoabilidade, age sem polidez ou desrespeita a dignidade do subordinado, configura-se abuso de poder que autoriza a responsabilização direta. Esta distinção é fundamental para a correta aplicação do instituto da responsabilidade civil em casos envolvendo relações hierárquicas na Administração Pública.
3.3. Responsabilização Objetiva vs. Responsabilização Subjetiva
A jurisprudência tem reconhecido que, mesmo nos casos em que se admite a responsabilização do ente público por atos de assédio moral praticados por seus agentes, a responsabilidade é subjetiva, baseada na culpa in vigilando ou in eligendo. Esta modalidade de responsabilização difere da responsabilidade objetiva prevista no artigo 37, §6º da Constituição Federal, que se aplica apenas aos atos praticados no exercício regular das funções públicas.
O Tribunal de Justiça do Paraná, em caso envolvendo coordenadora de escola, decidiu que “responsabilidade objetiva do município configurada. Falha na fiscalização dos servidores públicos. Dever do ente público de preservar a integridade moral e a dignidade de seus servidores” [6]. Esta decisão reconhece que a responsabilidade do ente público em casos de assédio moral é baseada na falha de fiscalização, configurando culpa administrativa, e não na responsabilidade objetiva prevista constitucionalmente.
Esta distinção é importante porque demonstra que, mesmo quando se admite a responsabilização do ente público, reconhece-se que os atos de assédio moral não se enquadram no exercício regular das funções públicas. Se assim fosse, a responsabilidade seria objetiva, independentemente de culpa. O fato de a jurisprudência exigir prova de culpa administrativa (falha na fiscalização) confirma que tais atos são irregulares e estranhos ao exercício normal das funções públicas.
IV. APLICAÇÃO AO CASO CONCRETO
4.1. Caracterização do Abuso de Poder
Os fatos narrados na petição inicial do processo em análise evidenciam a prática de atos que extrapolam os limites do exercício regular das funções de diretora escolar. As alegações de constrangimentos, perseguições, exclusão arbitrária das funções, difamação perante terceiros e imposição de condições laborais inadequadas configuram condutas abusivas que se desvinculam da finalidade pública e do interesse da Administração.
O poder diretivo escolar, embora amplo, não é ilimitado, devendo ser exercido dentro dos parâmetros da legalidade, razoabilidade e proporcionalidade. Quando o diretor escolar utiliza sua posição hierárquica para perseguir, constranger ou humilhar subordinados, extrapola os limites de sua competência legal, configurando abuso de poder que autoriza a responsabilização direta.
A alegada exclusão arbitrária das funções do autor, se comprovada, configura desvio de finalidade, pois o poder de gestão de pessoal deve ser exercido com base em critérios técnicos e objetivos, visando ao interesse público. Quando utilizado para fins persecutórios ou vingativos, caracteriza abuso de poder que se desvincula da atividade administrativa regular.
4.2. Desvinculação da Administração Pública
As condutas imputadas à ré não encontram amparo legal nem se enquadram no exercício regular das atribuições de diretora escolar. O cargo de diretor escolar tem por finalidade a gestão pedagógica e administrativa da unidade de ensino, visando à qualidade da educação e ao cumprimento dos objetivos educacionais. Atos persecutórios, constrangimentos e imposição de condições laborais inadequadas são estranhos a estas finalidades, configurando desvio de poder.
Quando a ré praticou os atos descritos na exordial, não agiu em nome da Administração Pública nem no interesse do serviço público, mas sim movida por interesses pessoais ou motivações estranhas ao interesse público. Esta desvinculação da Administração é o fundamento que autoriza a responsabilização direta, pois não há nexo de causalidade entre a atividade administrativa regular e os danos causados.
A teoria da desvinculação da Administração, amplamente aceita pela doutrina e jurisprudência, estabelece que o agente público que age com abuso de poder não pode invocar a proteção da responsabilidade objetiva do Estado, devendo responder pessoalmente pelos danos causados. Esta teoria encontra aplicação direta no caso em análise, onde as condutas imputadas à ré claramente extrapolam os limites do exercício regular das funções públicas.
4.3. Legitimidade Passiva da Ré
A legitimidade passiva da ré para figurar no polo passivo da demanda decorre da natureza irregular e abusiva das condutas a ela imputadas. Conforme estabelecido pela jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, quando o dano é provocado por conduta irregular do agente público, compreendendo-se como irregular a conduta estranha ao rol das atribuições funcionais, a ação indenizatória pode ser ajuizada diretamente em face do agente.
Os atos de perseguição, constrangimento e imposição de condições laborais inadequadas não se enquadram no rol normal das atribuições de diretora escolar, configurando condutas irregulares que autorizam a responsabilização direta. A ré, ao praticar tais atos, agiu fora dos limites de sua competência legal, não podendo invocar a proteção da responsabilidade objetiva do Estado.
A legitimidade passiva da ré é reforçada pelo fato de que os danos alegados decorrem diretamente de sua conduta pessoal, não havendo participação da Administração Pública na prática dos atos lesivos. O nexo de causalidade estabelece-se entre a conduta irregular da ré e os danos sofridos pelo autor, independentemente da relação funcional existente entre eles.
V. ESTRATÉGIA RECURSAL
5.1. Recurso Cabível: Apelação
O recurso cabível contra a sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito é a apelação, prevista no artigo 1.009 do Código de Processo Civil. A apelação é o recurso ordinário adequado para impugnar sentenças que põem fim ao processo, seja com ou sem resolução do mérito, permitindo a revisão integral da matéria decidida pelo juízo de primeiro grau.
No caso em análise, a sentença extinguiu o processo com base no artigo 485, inciso VI, do CPC, por ilegitimidade passiva da parte ré. Esta decisão pode ser reformada através de apelação, demonstrando-se que a ré possui legitimidade para figurar no polo passivo da demanda, com base nas exceções à regra geral estabelecidas pela doutrina e jurisprudência.
A apelação deverá ser interposta no prazo de quinze dias, contados da intimação da sentença, conforme artigo 1.003, §5º do CPC. O recurso deverá ser dirigido ao Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte, que possui competência para julgar recursos contra decisões proferidas pelos juízes de primeiro grau da Comarca de Natal.
5.2. Fundamentos do Recurso de Apelação
O recurso de apelação deverá fundamentar-se nos seguintes argumentos principais: erro de direito na aplicação da jurisprudência do STF (Tema 940); desconsideração das exceções consolidadas pela doutrina e jurisprudência; ausência de análise das particularidades do caso concreto; e aplicação mecânica da regra geral sem consideração das nuances jurisprudenciais.
O primeiro fundamento consiste na demonstração de que a magistrada de primeiro grau aplicou de forma absoluta e literal a jurisprudência do Tema 940 do STF, sem considerar as exceções reconhecidas pela doutrina e jurisprudência posterior. Esta aplicação mecânica constitui erro de direito que autoriza a reforma da decisão.
O segundo fundamento reside na demonstração de que existem exceções consolidadas à regra geral, especialmente em casos de abuso de poder e conduta irregular do agente público. Estas exceções encontram amparo na jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça e na doutrina especializada, devendo ser consideradas na análise do caso concreto.
O terceiro fundamento consiste na demonstração de que o caso apresenta particularidades que o enquadram nas exceções reconhecidas, especialmente no que se refere à natureza abusiva e irregular das condutas imputadas à ré. A ausência de análise destas particularidades constitui julgamento superficial que não atende aos requisitos de fundamentação adequada.
5.3. Pedidos na Apelação
Na apelação, deverão ser formulados os seguintes pedidos: reforma integral da sentença recorrida; reconhecimento da legitimidade passiva da ré; determinação do prosseguimento do feito para julgamento do mérito; e condenação da ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.
O pedido principal consiste na reforma integral da sentença, com o reconhecimento de que a ré possui legitimidade para figurar no polo passivo da demanda, com base nas exceções à regra geral estabelecidas pela doutrina e jurisprudência. Este pedido encontra fundamento nos argumentos desenvolvidos ao longo desta orientação.
O pedido subsidiário consiste na determinação do prosseguimento do feito para julgamento do mérito, permitindo que o autor comprove os fatos alegados na petição inicial e obtenha a reparação pelos danos sofridos. Este pedido é consequência lógica do reconhecimento da legitimidade passiva da ré.
5.4. Estratégia Processual Complementar
Além da interposição da apelação, recomenda-se a adoção de estratégias processuais complementares que fortaleçam a tese defensiva e aumentem as chances de êxito do recurso. Estas estratégias incluem: juntada de jurisprudência atualizada sobre o tema; citação de doutrina especializada; demonstração das particularidades do caso concreto; e argumentação persuasiva baseada em precedentes similares.
A juntada de jurisprudência atualizada é fundamental para demonstrar que existem precedentes favoráveis à tese defendida, especialmente decisões do Superior Tribunal de Justiça e dos Tribunais de Justiça estaduais que reconhecem a possibilidade de responsabilização direta do agente público em casos de abuso de poder.
A citação de doutrina especializada fortalece a fundamentação teórica do recurso, demonstrando que a tese defendida possui amparo científico e acadêmico. A doutrina é fonte importante do direito e sua citação adequada confere credibilidade e solidez aos argumentos apresentados.
VI. PROGNÓSTICO DE ÊXITO
6.1. Análise das Chances de Sucesso
Com base na pesquisa jurisprudencial realizada e na análise dos fundamentos doutrinários aplicáveis, estima-se que o recurso de apelação possui chances significativas de êxito. A existência de precedentes favoráveis, especialmente do Superior Tribunal de Justiça, e o amparo doutrinário da tese defendida constituem fatores positivos para o sucesso do recurso.
A jurisprudência dos Tribunais de Justiça estaduais tem demonstrado crescente receptividade à tese da responsabilização direta do agente público em casos de abuso de poder e assédio moral. Esta tendência jurisprudencial favorece a reforma da decisão recorrida, especialmente considerando as particularidades do caso concreto.
A solidez dos fundamentos jurídicos apresentados, baseados em doutrina especializada e jurisprudência consolidada, confere consistência à tese defensiva e aumenta as perspectivas de êxito do recurso. A demonstração clara das exceções à regra geral estabelecida pelo Tema 940 do STF constitui argumento persuasivo para a reforma da decisão.
6.2. Riscos e Considerações
Não obstante as perspectivas favoráveis, é importante considerar os riscos inerentes ao recurso, especialmente a possibilidade de o Tribunal de Justiça manter a aplicação literal da jurisprudência do Tema 940 do STF. Esta possibilidade, embora reduzida diante dos fundamentos apresentados, deve ser considerada na estratégia processual.
O principal risco consiste na eventual resistência do tribunal em reconhecer as exceções à regra geral, especialmente se houver entendimento conservador sobre a aplicação da jurisprudência do STF. Neste caso, seria necessário considerar a interposição de recursos especiais para os tribunais superiores.
Outro risco a ser considerado é a eventual exigência de prova mais robusta sobre a natureza abusiva das condutas imputadas à ré. Embora a questão da legitimidade passiva seja matéria de direito, o tribunal pode entender necessária a análise mais aprofundada dos fatos para caracterizar o abuso de poder.
6.3. Estratégias de Mitigação de Riscos
Para mitigar os riscos identificados, recomenda-se a adoção de estratégias específicas que fortaleçam a argumentação e aumentem as chances de êxito. Estas estratégias incluem: fundamentação exaustiva baseada em precedentes; demonstração clara das particularidades do caso; argumentação persuasiva sobre a natureza irregular das condutas; e preparação para eventual necessidade de recursos aos tribunais superiores.
A fundamentação exaustiva baseada em precedentes é essencial para demonstrar que a tese defendida não constitui inovação jurisprudencial, mas sim aplicação de entendimento já consolidado pelos tribunais superiores. A citação adequada de precedentes similares confere credibilidade e solidez aos argumentos apresentados.
A demonstração clara das particularidades do caso é fundamental para distingui-lo dos casos em que se aplica a regra geral do Tema 940 do STF. Esta demonstração deve evidenciar a natureza abusiva e irregular das condutas imputadas à ré, caracterizando sua desvinculação da Administração Pública.
VII. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
7.1. Síntese da Análise Jurídica
A análise realizada demonstra que a sentença proferida pela magistrada de primeiro grau incorreu em erro de direito ao aplicar de forma absoluta e literal a jurisprudência do Tema 940 do STF, sem considerar as exceções consolidadas pela doutrina e jurisprudência posterior. O caso em análise apresenta particularidades que o enquadram nas exceções reconhecidas, especialmente no que se refere ao alegado abuso de poder praticado pela ré no exercício de suas funções.
A doutrina especializada e a jurisprudência dos tribunais superiores reconhecem que a regra geral estabelecida pelo artigo 37, §6º da Constituição Federal não é absoluta, admitindo exceções em casos específicos onde o agente público age com abuso de poder ou de forma irregular. Estas exceções encontram fundamento na teoria da desvinculação da Administração, que estabelece que o agente público que age irregularmente não pode invocar a proteção da responsabilidade objetiva do Estado.
A jurisprudência específica sobre assédio moral em ambiente escolar tem consolidado entendimento favorável à responsabilização direta de diretores escolares em casos de abuso de poder. Esta linha jurisprudencial reconhece que condutas abusivas praticadas por superiores hierárquicos no ambiente escolar configuram atos estranhos ao exercício regular das funções públicas, autorizando a responsabilização pessoal do agente.
7.2. Recomendação Principal
Com base na análise realizada, recomenda-se a interposição de recurso de apelação contra a sentença que extinguiu o processo sem resolução do mérito. O recurso deverá fundamentar-se nas exceções à regra geral estabelecidas pela doutrina e jurisprudência, demonstrando que a ré possui legitimidade para figurar no polo passivo da demanda em razão da natureza abusiva e irregular das condutas a ela imputadas.
A apelação deverá ser interposta no prazo legal de quinze dias, com fundamentação exaustiva baseada nos precedentes e doutrina citados nesta orientação. O recurso possui chances significativas de êxito, considerando a solidez dos fundamentos jurídicos apresentados e a tendência jurisprudencial favorável à tese defendida.
A estratégia recursal deverá enfatizar a distinção entre atos praticados no exercício regular das funções públicas e atos praticados com abuso de poder, demonstrando que apenas os primeiros estão protegidos pela responsabilidade objetiva do Estado. Esta distinção é fundamental para a correta aplicação do instituto da responsabilidade civil e encontra amparo tanto na doutrina quanto na jurisprudência dos tribunais superiores.
7.3. Considerações Finais
O presente caso representa oportunidade importante para a consolidação da jurisprudência sobre as exceções à regra geral estabelecida pelo Tema 940 do STF. A interposição do recurso de apelação, com fundamentação adequada, pode contribuir para o desenvolvimento da jurisprudência sobre responsabilização direta do agente público em casos de abuso de poder.
A defesa dos direitos do autor exige a utilização de todos os instrumentos processuais disponíveis, especialmente considerando a natureza dos danos alegados e a importância da reparação adequada. A responsabilização direta da ré é medida de justiça que encontra amparo legal e jurisprudencial, devendo ser perseguida através dos recursos cabíveis.
A orientação jurídica apresentada fornece os fundamentos necessários para a interposição do recurso de apelação, com base em pesquisa exaustiva da doutrina e jurisprudência aplicáveis. A implementação da estratégia recursal recomendada oferece perspectivas favoráveis para a reforma da decisão recorrida e o prosseguimento do feito para julgamento do mérito.
REFERÊNCIAS
[1] SOUZA, Maria Júlia Marcondes de Moura e. Desvio e Excesso na Atuação do Agente Público e Responsabilidade Pessoal. Cognitio Juris, Volume 14, Número 55, Junho de 2024. Disponível em: https://cognitiojuris.com.br/desvio-e-excesso-na-atuacao-do-agente-publico-e-responsabilidade-pessoal/
[2] SANTOS, Romualdo Baptista dos. A responsabilidade civil do estado e dos agentes públicos: o tema 940 do STF e o caso Lula Vs Dellagnol. Migalhas, 7 de julho de 2022. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/coluna/migalhas-de-responsabilidade-civil/369307/a-responsabilidade-civil-do-estado-e-dos-agentes-publicos
[3] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ. Recurso Inominado. Assédio Moral Praticado em Escola – Jurisprudência. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=assedio+moral+praticado+em+escola
[4] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE MINAS GERAIS. Apelação Cível. Professora Readaptada – Assédio Moral. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=assedio+moral+praticado+em+escola
[5] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ. Apelação Cível. Alegação de Perseguição a Professora. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=assedio+moral+praticado+em+escola
[6] TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ. Apelação Cível. Ação Indenizatória – Coordenadora de Escola. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/busca?q=assedio+moral+praticado+em+escola
FELIPE ANTÔNIO BARROSO ANDRADE MEDEIROS
ADVOGADO OAB/CE 52.487, OAB/RN 22.344-A
ADVOGADO OAB/CE 52.487, OAB/RN 22.344-A