Acesso à Justiça: Um Direito Fundamental Mesmo com o Patrimônio Bloqueado?

O direito de acesso à justiça é uma das colunas mestras do Estado Democrático de Direito, assegurado pela Constituição Federal brasileira em seu artigo 5º, inciso XXXV. Ele garante que nenhuma lesão ou ameaça a direito será subtraída da apreciação do Poder Judiciário. Contudo, o exercício desse direito frequentemente envolve custos – as chamadas custas processuais – que podem se tornar um obstáculo para muitos cidadãos. Para mitigar essa barreira, o ordenamento jurídico prevê o benefício da Justiça Gratuita, mas sua aplicação em situações patrimoniais complexas, como o bloqueio judicial de bens, suscita importantes debates.

O Que é a Justiça Gratuita e a Quem se Destina?

Comumente associada a um estado de miséria ou pobreza absoluta, a Justiça Gratuita é, na verdade, um instrumento mais amplo. Prevista no Código de Processo Civil (CPC), em seus artigos 98 e seguintes, ela se destina àqueles com insuficiência de recursos para pagar as custas, as despesas processuais e os honorários advocatícios. A lei não exige um estado de completa indigência, mas sim a demonstração de que o pagamento desses valores comprometeria o sustento do indivíduo ou de sua família.
A análise para a concessão do benefício não deve se ater a uma fotografia estática do patrimônio de uma pessoa, mas sim à sua real e momentânea capacidade de dispor de recursos financeiros – o que os juristas chamam de liquidez. É perfeitamente possível que alguém possua bens (imóveis, veículos, investimentos), mas não tenha acesso a dinheiro em espécie para arcar com as despesas imediatas de um processo judicial.

O Paradoxo do Patrimônio Bloqueado

Uma das situações mais emblemáticas e desafiadoras nesse contexto ocorre quando o patrimônio de uma pessoa é bloqueado por uma decisão judicial, geralmente em processos criminais ou de execução. À primeira vista, a existência de valores vultosos em contas ou investimentos poderia levar um magistrado a concluir, de forma apressada, pela ausência do direito à gratuidade.
Contudo, essa interpretação ignora a essência do problema: o dinheiro, embora existente, está indisponível. O titular desses recursos não pode utilizá-los para nenhuma finalidade, inclusive para o pagamento das custas judiciais. Nesse cenário, a existência de patrimônio bloqueado não é um sinal de riqueza disponível, mas sim a prova mais contundente da impossibilidade material de arcar com os custos do processo. Exigir que a pessoa pague por um direito que lhe é negado pelo próprio Estado-Juiz cria um ciclo vicioso de negação de justiça.

A Atuação Jurídica na Defesa do Acesso à Justiça

Diante de uma negativa de Justiça Gratuita em um cenário de bens bloqueados, a atuação de uma advocacia especializada torna-se fundamental. O trabalho do advogado transcende a simples alegação de hipossuficiência. É necessário construir uma argumentação jurídica sólida e apresentar um conjunto probatório robusto que demonstre, de forma inequívoca, a iliquidez financeira do cliente.
Isso envolve a coleta de documentos essenciais, como:
Decisões judiciais que determinaram o bloqueio de bens.
Extratos bancários que evidenciem a constrição dos valores.
Relatórios do Banco Central (Registrato) que comprovem a extensão do bloqueio em todo o sistema financeiro.
Comprovantes de dívidas e de recusa de pagamentos por insuficiência de saldo.
Com base nessa documentação, o advogado pode interpor os recursos cabíveis, como o Agravo de Instrumento, para levar a questão a uma instância superior do Judiciário. O objetivo é demonstrar ao Tribunal que a decisão inicial foi proferida com base em um error in judicando (erro de julgamento), ao interpretar de forma equivocada a realidade fática e probatória dos autos, violando o direito fundamental de acesso à justiça.

Conclusão

O direito à Justiça Gratuita é um instrumento vital para a efetivação da cidadania e não pode ser negado com base em análises superficiais da capacidade econômica de um indivíduo. A indisponibilidade de patrimônio, decorrente de um bloqueio judicial, é uma das mais fortes evidências da necessidade de se conceder o benefício, garantindo que o cidadão possa defender seus direitos, inclusive aqueles relacionados à sua honra e imagem, que porventura tenham sido violados.
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