Direito ao Tratamento do Autismo: O que os Planos de Saúde Devem Cobrir?

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição que abrange um conjunto de desafios no desenvolvimento neurológico, impactando a comunicação, a interação social e o comportamento. Para garantir o pleno desenvolvimento e a qualidade de vida das pessoas com TEA, o acesso a tratamentos e terapias especializadas é fundamental. No Brasil, a legislação tem avançado significativamente para assegurar esses direitos, especialmente no que tange à cobertura por planos de saúde. Este artigo explora o panorama legal que ampara as pessoas com autismo e suas famílias, detalhando as obrigações das operadoras de saúde.

O Marco Legal: A Lei Berenice Piana e o Estatuto da Pessoa com Deficiência

Um dos principais avanços na garantia dos direitos das pessoas com autismo foi a promulgação da Lei nº 12.764/2012, conhecida como Lei Berenice Piana. Em seu artigo 1º, parágrafo 2º, a lei estabelece um ponto crucial: “A pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais” [1]. Essa equiparação foi um divisor de águas, pois estendeu às pessoas com TEA toda a proteção jurídica já conferida às pessoas com deficiência, incluindo as disposições do Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015).
A Lei Berenice Piana também instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, cujas diretrizes incluem a atenção integral às necessidades de saúde, o diagnóstico precoce, o atendimento multiprofissional e o acesso a medicamentos e nutrientes. Além disso, a lei proíbe expressamente que a pessoa com autismo seja impedida de participar de planos privados de assistência à saúde em razão de sua condição [1].

A Atuação da ANS: Fim da Limitação de Terapias

Apesar do arcabouço legal, muitas famílias ainda enfrentavam barreiras para obter a cobertura integral dos tratamentos prescritos, principalmente a limitação no número de sessões de terapia. Uma mudança fundamental ocorreu com a Resolução Normativa (RN) nº 539/2022 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A partir de 1º de julho de 2022, a ANS tornou obrigatória a cobertura para qualquer método ou técnica indicado pelo médico assistente para o tratamento de pacientes com transtornos globais do desenvolvimento (CID F84), incluindo o autismo [2].
Essa resolução também determinou o fim da limitação de sessões com fonoaudiólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais e fisioterapeutas. Isso significa que, se houver prescrição médica para um número específico de sessões, o plano de saúde é obrigado a cobrir integralmente o tratamento, sem impor limites. A normativa abrange diversas abordagens terapêuticas, como:
Análise do Comportamento Aplicada (ABA)
Modelo Denver de Intervenção Precoce (ESDM)
Integração Sensorial
Comunicação Alternativa e Suplementar (PECS)

Principais Direitos e Como Exigi-los

É crucial que as famílias conheçam seus direitos para poderem exigi-los. A recusa de cobertura ou a imposição de limites indevidos pelos planos de saúde são práticas ilegais. Abaixo, uma tabela resume os principais direitos e como proceder em caso de negativa.
Direito
Descrição
Como Proceder em Caso de Negativa –
Cobertura Integral de Terapias
O plano de saúde deve cobrir integralmente o tratamento prescrito pelo médico, incluindo o número de sessões e os métodos indicados (ABA, Denver, etc.), sem limitação. –
1. Contato com a Operadora: Formalize a solicitação de cobertura por escrito (e-mail, protocolo de atendimento). Guarde todos os registros. 2. Notificação Extrajudicial: Se a negativa persistir, envie uma notificação extrajudicial, elaborada por um advogado, exigindo o cumprimento da lei. 3. Ação Judicial: Caso a operadora não cumpra a solicitação, é possível ingressar com uma ação judicial, muitas vezes com pedido de liminar, para garantir o início imediato do tratamento.
Acompanhante Especializado na Escola
Alunos com TEA matriculados em escolas regulares (públicas ou privadas) têm direito a um acompanhante especializado, se houver recomendação médica. A escola não pode cobrar valores adicionais por esse profissional. –
1. Laudo Médico: Apresente à escola o laudo médico que atesta a necessidade do acompanhante. 2. Diálogo com a Escola: Tente resolver a questão diretamente com a direção da escola. 3. Denúncia: Se a escola se recusar, denuncie à Secretaria de Educação e ao Ministério Público. A recusa de matrícula é crime. –
Transporte e Isenções Fiscais
Pessoas com TEA têm direito a isenções de impostos (IPI, ICMS, IPVA) na compra de veículos, Passe Livre para transporte interestadual, transporte municipal gratuito e uso de vagas especiais de estacionamento.
1. Obtenha os Laudos: Tenha em mãos os laudos médicos que comprovam o TEA. 2. Procure os Órgãos Competentes: Cada benefício é solicitado em um órgão diferente (Receita Federal, Secretarias da Fazenda Estaduais, prefeituras). 3. Assessoria Jurídica: Um advogado pode auxiliar na organização da documentação e no acompanhamento dos processos. –

A Importância da Assessoria Jurídica Especializada

Navegar pelas complexidades da legislação e lidar com a burocracia dos planos de saúde pode ser um desafio para as famílias. A negativa de cobertura de um tratamento essencial pode gerar grande angústia e prejuízos ao desenvolvimento da pessoa com autismo. Por isso, contar com o suporte de uma advocacia especializada em Direito da Saúde é fundamental.
Um advogado com experiência na área pode orientar sobre os documentos necessários, elaborar notificações extrajudiciais e, se necessário, ingressar com ações judiciais para garantir que os direitos sejam respeitados de forma rápida e eficaz. O escritório Felipe Medeiros Advocacia possui vasta experiência na defesa dos direitos das pessoas com autismo, atuando de forma estratégica para assegurar o acesso integral a tratamentos e terapias.

Referências

[1] BRASIL. Lei nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012. Institui a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista. Disponível em: . Acesso em: 08 out. 2025.
[2] AGÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE SUPLEMENTAR. ANS amplia regras de cobertura para tratamento de transtornos globais do desenvolvimento. 2022. Disponível em: https://www.gov.br/ans/pt-br/assuntos/noticias/beneficiario/ans-altera-regras-de-cobertura-para-tratamento-de-transtornos-globais-do-desenvolvimento. Acesso em: 08 out. 2025.