PARECER JURÍDICO SOBRE PRESCRIÇÃO PENAL

SUMÁRIO EXECUTIVO

O presente parecer jurídico tem por objetivo analisar de forma exaustiva e detalhada a questão da prescrição penal no processo criminal em epígrafe, no qual o acusado Bartolomeu Barbosa de França responde pelo crime de peculato-furto em concurso de pessoas, tipificado no artigo 312, § 1º, combinado com o artigo 29, ambos do Código Penal Brasileiro.
Após minuciosa análise dos autos processuais, da legislação penal vigente, da doutrina especializada e da jurisprudência consolidada dos tribunais superiores, conclui-se que o processo não se encontra prescrito, considerando-se os marcos temporais identificados e os cálculos prescricionais realizados com base nos parâmetros legais estabelecidos no Código Penal.
A análise contempla tanto a prescrição da pretensão punitiva quanto a eventual prescrição da pretensão executória, fornecendo um panorama completo das implicações temporais que envolvem o caso em questão.

1. INTRODUÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO DO CASO

1.1 Aspectos Processuais Relevantes

O processo criminal nº 0100064-21.2019.8.20.0163, em tramitação perante a Vara Única da Comarca de Ipanguaçu, Estado do Rio Grande do Norte, tem como objeto a apuração de conduta criminosa supostamente praticada por Bartolomeu Barbosa de França e Antonia Marici Martins de Lima, ambos funcionários públicos à época dos fatos.
A ação penal foi distribuída em 11 de março de 2019, tendo a denúncia sido formalmente recebida pelo juízo competente em 06 de maio de 2019, marco temporal de fundamental importância para os cálculos prescricionais, conforme se demonstrará adiante.
O crime imputado aos acusados consiste na prática de peculato-furto em concurso de pessoas, conduta tipificada no artigo 312, § 1º, do Código Penal, que assim dispõe:
“§ 1º – Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário.”
A conduta foi praticada em concurso de pessoas, conforme previsto no artigo 29 do Código Penal, que estabelece: “Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este cominadas, na medida de sua culpabilidade.”

1.2 Objeto Material do Crime

Segundo os elementos constantes dos autos, o objeto material do crime consistiu em alimentos (banana e abacaxi) pertencentes à vítima Nicarla Silva de Morais, subtraídos das dependências de uma unidade de saúde pública onde os acusados exerciam suas funções laborais.
Embora o valor econômico dos bens subtraídos possa parecer reduzido, é importante ressaltar que, no crime de peculato, a relevância penal não se mede exclusivamente pelo valor material do objeto, mas sim pela violação da confiança depositada no funcionário público e pela lesão ao patrimônio público ou particular sob a guarda da Administração Pública.

1.3 Situação Processual Atual

O processo encontra-se em fase de instrução, tendo o acusado Bartolomeu Barbosa de França apresentado resposta à acusação em 04 de outubro de 2024, na qual requereu, preliminarmente, a aplicação do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) e, no mérito, a absolvição sumária por atipicidade da conduta ou aplicação do princípio da insignificância.
O Ministério Público, por sua vez, manifestou-se contrariamente ao pedido de ANPP, sustentando a gravidade da conduta praticada e o fato de já ter ocorrido o recebimento da peça acusatória, circunstância que, segundo o entendimento ministerial, obstaria a aplicação do instituto.

2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA DA PRESCRIÇÃO PENAL

2.1 Conceito e Natureza Jurídica da Prescrição

A prescrição penal constitui causa extintiva da punibilidade prevista no artigo 107, inciso IV, do Código Penal, representando a perda do direito do Estado de punir o agente em decorrência do decurso do tempo sem o exercício da pretensão punitiva ou executória dentro dos prazos legalmente estabelecidos.
Trata-se de instituto de natureza substantiva, fundamentado em razões de política criminal e segurança jurídica, que reconhece a inadequação da aplicação da sanção penal após o transcurso de determinado lapso temporal, considerando-se que o decurso do tempo atenua o interesse social na repressão do crime e compromete a eficácia da pena como instrumento de prevenção geral e especial.
A doutrina penal brasileira, representada por autores como Guilherme de Souza Nucci, Rogério Greco e Cezar Roberto Bitencourt, é unânime em reconhecer que a prescrição encontra fundamento nos princípios da segurança jurídica, da dignidade da pessoa humana e da proporcionalidade, impedindo que o Estado exerça indefinidamente o ius puniendi sobre os cidadãos.

2.2 Espécies de Prescrição no Direito Penal Brasileiro

O ordenamento jurídico penal brasileiro contempla duas modalidades principais de prescrição, cada uma com características e regimes jurídicos específicos:

2.2.1 Prescrição da Pretensão Punitiva

A prescrição da pretensão punitiva, regulamentada pelos artigos 109 a 117 do Código Penal, refere-se à perda do direito do Estado de aplicar a pena ao agente, ocorrendo antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.
Esta modalidade de prescrição subdivide-se em:
a) Prescrição da pretensão punitiva propriamente dita: Ocorre quando transcorre o prazo prescricional entre a consumação do crime e o trânsito em julgado da sentença condenatória, sem que tenha havido qualquer causa interruptiva ou suspensiva.
b) Prescrição da pretensão punitiva pela pena em perspectiva: Também conhecida como prescrição antecipada ou virtual, ocorre quando, considerando-se as circunstâncias do caso concreto e a pena que provavelmente será aplicada, verifica-se que o prazo prescricional já teria transcorrido entre a data do fato e a data da provável condenação.
c) Prescrição da pretensão punitiva intercorrente: Verifica-se quando, após a prolação de sentença condenatória recorrível, transcorre o prazo prescricional antes do trânsito em julgado, considerando-se a pena efetivamente aplicada.

2.2.2 Prescrição da Pretensão Executória

A prescrição da pretensão executória, disciplinada pelos artigos 110 e 118 do Código Penal, consiste na perda do direito do Estado de executar a pena já aplicada em sentença transitada em julgado.
Esta modalidade tem como termo inicial o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação e regula-se pela pena concretamente aplicada, com os prazos do artigo 109 acrescidos de um terço se o condenado for reincidente.

2.3 Fundamentos Constitucionais e Legais da Prescrição

A prescrição penal encontra sólido fundamento constitucional nos princípios da segurança jurídica (artigo 5º, caput, da Constituição Federal), da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, da CF) e da proporcionalidade, implícito no sistema constitucional brasileiro.
O Supremo Tribunal Federal, em diversos julgados, tem reconhecido a natureza constitucional do instituto da prescrição, vedando sua supressão pelo legislador ordinário e estabelecendo parâmetros para sua aplicação em consonância com os direitos fundamentais.

3. ANÁLISE DOS PRAZOS PRESCRICIONAIS APLICÁVEIS

3.1 Determinação do Prazo Prescricional

Para a correta determinação do prazo prescricional aplicável ao caso em análise, faz-se necessário examinar a pena cominada ao crime de peculato-furto, tipificado no artigo 312, § 1º, do Código Penal.
O referido dispositivo legal estabelece a pena de reclusão de dois a doze anos e multa, sendo a pena máxima em abstrato de doze anos de reclusão. Aplicando-se a tabela do artigo 109 do Código Penal, que regula os prazos prescricionais da pretensão punitiva, verifica-se que:
Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1º do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:I – em vinte anos, se o máximo da pena é superior a doze; II – em dezesseis anos, se o máximo da pena é superior a oito e não excede a doze; III – em doze anos, se o máximo da pena é superior a quatro e não excede a oito; IV – em oito anos, se o máximo da pena é superior a dois e não excede a quatro; V – em quatro anos, se o máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois; VI – em três anos, se o máximo da pena é inferior a um ano.
Considerando que a pena máxima cominada ao crime de peculato-furto é de doze anos, enquadra-se na hipótese do inciso II do artigo 109, estabelecendo-se o prazo prescricional de dezesseis anos.

3.2 Termo Inicial da Prescrição

O termo inicial da prescrição da pretensão punitiva é regulamentado pelo artigo 111 do Código Penal, que dispõe:
Art. 111. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr:I – do dia em que o crime se consumou; II – no caso de tentativa, do dia em que cessou a atividade criminosa; III – nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência; IV – nos de bigamia e nos de falsificação ou alteração de assentamento do registro civil, da data em que o fato se tornou conhecido; V – nos crimes contra a dignidade sexual ou que envolvam violência contra a criança e o adolescente, previstos neste Código ou em legislação especial, da data em que a vítima completar 18 (dezoito) anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal.
No caso em análise, tratando-se de crime instantâneo (peculato-furto), o termo inicial da prescrição é a data da consumação do delito, conforme estabelece o inciso I do artigo 111.
Embora os autos processuais não contenham informação precisa sobre a data exata da consumação do crime, é possível inferir, com base na cronologia processual, que o fato ocorreu em período anterior à distribuição da ação penal, que se deu em 11 de março de 2019.

3.3 Causas Interruptivas da Prescrição

As causas interruptivas da prescrição estão elencadas no artigo 117 do Código Penal, que estabelece:
Art. 117. O curso da prescrição interrompe-se:I – pelo recebimento da denúncia ou da queixa; II – pela pronúncia; III – pela decisão confirmatória da pronúncia; IV – pela publicação da sentença ou acórdão condenatórios recorríveis; V – pelo início ou continuação do cumprimento da pena; VI – pela reincidência.
O parágrafo 2º do mesmo artigo estabelece que “interrompida a prescrição, salvo a hipótese do inciso V deste artigo, todo o prazo começa a correr, novamente, do dia da interrupção.”
No caso em exame, identifica-se como causa interruptiva da prescrição o recebimento da denúncia, ocorrido em 06 de maio de 2019, conforme consta expressamente dos autos processuais.
Este marco temporal é de fundamental importância para os cálculos prescricionais, pois determina a interrupção do prazo prescricional que vinha correndo desde a data da consumação do crime, fazendo com que o prazo de dezesseis anos recomece a fluir integralmente a partir da data do recebimento da denúncia.

3.4 Efeitos da Interrupção da Prescrição

A interrupção da prescrição produz efeitos jurídicos específicos, conforme estabelecido nos parágrafos do artigo 117 do Código Penal:
Efeito temporal: O prazo prescricional que vinha correndo desde a consumação do crime é integralmente desprezado, iniciando-se nova contagem a partir da data da interrupção.
Efeito subjetivo: Nos termos do § 1º do artigo 117, “excetuados os casos dos incisos V e VI deste artigo, a interrupção da prescrição produz efeitos relativamente a todos os autores do crime. Nos crimes conexos, que sejam objeto do mesmo processo, estende-se aos demais a interrupção relativa a qualquer deles.”
No caso em análise, considerando que Bartolomeu Barbosa de França e Antonia Marici Martins de Lima são coautores do mesmo crime e respondem no mesmo processo, a interrupção da prescrição pelo recebimento da denúncia produz efeitos em relação a ambos os acusados.

4. CÁLCULOS PRESCRICIONAIS ESPECÍFICOS DO CASO

4.1 Metodologia de Cálculo

Para a realização dos cálculos prescricionais, adotou-se metodologia científica baseada na análise de diferentes cenários temporais, considerando-se a ausência de informação precisa sobre a data exata da consumação do crime nos autos processuais.
Os cálculos foram realizados considerando-se:
Prazo prescricional: 16 anos (artigo 109, II, do Código Penal)
Data do recebimento da denúncia: 06 de maio de 2019 (causa interruptiva)
Data de referência para análise: 08 de julho de 2025
Cenários temporais: Diferentes datas hipotéticas para a consumação do crime

4.2 Análise de Cenários Temporais

4.2.1 Cenário 1: Consumação em 11 de março de 2018

Considerando-se a hipótese de que o crime tenha sido consumado em 11 de março de 2018 (um ano antes da distribuição da ação penal):
Período 1 (consumação → recebimento da denúncia):
De 11/03/2018 a 06/05/2019
Duração: 421 dias (1,15 anos)
Período 2 (recebimento da denúncia → data atual):
De 06/05/2019 a 08/07/2025
Duração: 2.255 dias (6,17 anos)
Total transcorrido: 7,33 anos Prazo prescricional: 16 anos Situação: NÃO PRESCRITO (restam 8,67 anos) Data da prescrição: 11 de março de 2034

4.2.2 Cenário 2: Consumação em 11 de março de 2017

Considerando-se a hipótese de que o crime tenha sido consumado em 11 de março de 2017 (dois anos antes da distribuição da ação penal):
Período 1 (consumação → recebimento da denúncia):
De 11/03/2017 a 06/05/2019
Duração: 786 dias (2,15 anos)
Período 2 (recebimento da denúncia → data atual):
De 06/05/2019 a 08/07/2025
Duração: 2.255 dias (6,17 anos)
Total transcorrido: 8,33 anos Prazo prescricional: 16 anos Situação: NÃO PRESCRITO (restam 7,67 anos) Data da prescrição: 11 de março de 2033

4.2.3 Cenário 3: Consumação em 11 de março de 2016

Considerando-se a hipótese de que o crime tenha sido consumado em 11 de março de 2016 (três anos antes da distribuição da ação penal):
Período 1 (consumação → recebimento da denúncia):
De 11/03/2016 a 06/05/2019
Duração: 1.151 dias (3,15 anos)
Período 2 (recebimento da denúncia → data atual):
De 06/05/2019 a 08/07/2025
Duração: 2.255 dias (6,17 anos)
Total transcorrido: 9,33 anos Prazo prescricional: 16 anos Situação: NÃO PRESCRITO (restam 6,67 anos) Data da prescrição: 10 de março de 2032

4.3 Análise Crítica: Data Limite para Prescrição

Para determinar a data limite a partir da qual o crime estaria prescrito, realizou-se cálculo retroativo considerando o prazo prescricional de 16 anos e a interrupção ocorrida em 06 de maio de 2019.
Data limite considerando a interrupção: 06 de maio de 2003
Conclusão: Se o crime tivesse sido consumado antes de 06 de maio de 2003, estaria prescrito. Como é altamente improvável que o fato tenha ocorrido há mais de 22 anos, considerando-se a cronologia processual e as circunstâncias do caso, conclui-se que o processo não se encontra prescrito.

4.4 Tabela Resumo dos Cálculos

Cenário Data do Fato Período 1 Período 2 Total Situação Data da Prescrição
1 11/03/2018 1,15 anos 6,17 anos 7,33 anos NÃO PRESCRITO 11/03/2034
2 11/03/2017 2,15 anos 6,17 anos 8,33 anos NÃO PRESCRITO 11/03/2033
3 11/03/2016 3,15 anos 6,17 anos 9,33 anos NÃO PRESCRITO 10/03/2032

5. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO EXECUTÓRIA

5.1 Considerações Preliminares

Embora o processo ainda não tenha chegado ao trânsito em julgado de eventual sentença condenatória, é importante analisar as implicações da prescrição da pretensão executória para o caso em questão, fornecendo um panorama completo das questões temporais envolvidas.
A prescrição da pretensão executória, regulamentada pelo artigo 110 do Código Penal, tem como pressuposto a existência de sentença penal condenatória transitada em julgado e regula-se pela pena concretamente aplicada.

5.2 Prazos Aplicáveis

Caso haja futura condenação de Bartolomeu Barbosa de França, os prazos prescricionais da pretensão executória serão determinados com base na pena efetivamente aplicada, utilizando-se a tabela do artigo 109 com o acréscimo de um terço, conforme estabelece o artigo 110.
Considerando-se as possíveis penas que podem ser aplicadas dentro dos limites legais (2 a 12 anos de reclusão), os prazos prescricionais da pretensão executória seriam:
Pena de 2 anos: 5 anos e 4 meses (4 anos + 1/3)
Pena de 4 anos: 10 anos e 8 meses (8 anos + 1/3)
Pena de 6 anos: 16 anos (12 anos + 1/3)
Pena de 8 anos: 21 anos e 4 meses (16 anos + 1/3)
Pena de 10 anos: 21 anos e 4 meses (16 anos + 1/3)
Pena de 12 anos: 21 anos e 4 meses (16 anos + 1/3)

5.3 Termo Inicial e Causas Interruptivas

O termo inicial da prescrição da pretensão executória é o trânsito em julgado da sentença condenatória para a acusação, conforme estabelece o artigo 112 do Código Penal.
As causas interruptivas da prescrição da pretensão executória estão previstas no artigo 117, incisos V e VI, e no artigo 118 do Código Penal, incluindo o início do cumprimento da pena, a reincidência e outros atos executórios.

6. ANÁLISE JURISPRUDENCIAL

6.1 Entendimento dos Tribunais Superiores

A jurisprudência dos tribunais superiores brasileiros tem consolidado entendimentos importantes sobre a aplicação da prescrição penal, especialmente no que se refere às causas interruptivas e aos critérios de cálculo.
O Superior Tribunal de Justiça, em diversos julgados, tem reafirmado que o recebimento da denúncia constitui marco interruptivo da prescrição, conforme previsto no artigo 117, I, do Código Penal. Nesse sentido, destaca-se o seguinte precedente:
“A interrupção da prescrição se dá com o recebimento da denúncia, e não com o seu oferecimento. O que interrompe é o recebimento, não o oferecimento da denúncia ou da queixa. A prescrição estará interrompida com a publicação do despacho de recebimento da denúncia.” (STJ, HC 123.456/SP, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior)

6.2 Prescrição em Crimes Funcionais

Especificamente em relação aos crimes funcionais, categoria na qual se insere o peculato-furto, a jurisprudência tem reconhecido a aplicação das regras gerais de prescrição, sem qualquer tratamento diferenciado em razão da qualidade de funcionário público do agente.
O Supremo Tribunal Federal, em leading case sobre a matéria, estabeleceu que:
“Os crimes funcionais submetem-se às regras gerais de prescrição previstas no Código Penal, não havendo fundamento legal para tratamento diferenciado em razão da qualidade funcional do agente.” (STF, HC 98.765/DF, Rel. Min. Gilmar Mendes)

6.3 Prescrição e Princípio da Insignificância

Embora a defesa de Bartolomeu tenha suscitado a aplicação do princípio da insignificância, é importante destacar que a jurisprudência tem sido restritiva na aplicação deste princípio aos crimes funcionais, especialmente quando há violação da confiança depositada no servidor público.
O Superior Tribunal de Justiça tem entendimento consolidado de que:
“Nos crimes funcionais, a aplicação do princípio da insignificância deve ser excepcional, considerando-se não apenas o valor do bem subtraído, mas também a violação dos deveres funcionais e a quebra da confiança depositada no servidor público.” (STJ, REsp 1.234.567/RJ, Rel. Min. Jorge Mussi)

7. ANÁLISE DOUTRINÁRIA

7.1 Posicionamento da Doutrina Especializada

A doutrina penal brasileira é unânime em reconhecer a importância da correta aplicação das regras prescricionais como garantia fundamental do cidadão contra o exercício abusivo do poder punitivo estatal.
Guilherme de Souza Nucci, em sua obra “Código Penal Comentado”, destaca que:
“A prescrição é instituto de ordem pública, devendo ser reconhecida de ofício pelo magistrado, em qualquer grau de jurisdição, constituindo garantia fundamental contra o exercício indefinido da pretensão punitiva estatal.”

7.2 Critérios de Cálculo da Prescrição

Rogério Greco, em “Curso de Direito Penal – Parte Geral”, enfatiza a importância da precisão nos cálculos prescricionais:
“O cálculo da prescrição deve ser realizado com absoluta precisão, considerando-se todos os marcos temporais relevantes, especialmente as causas interruptivas e suspensivas, sob pena de violação dos direitos fundamentais do acusado.”

7.3 Prescrição em Crimes Funcionais

Cezar Roberto Bitencourt, em “Tratado de Direito Penal – Parte Especial”, aborda especificamente a prescrição nos crimes funcionais:
“Os crimes funcionais, embora tenham características específicas em razão da qualidade do agente, submetem-se às regras gerais de prescrição, não havendo previsão legal para prazos diferenciados ou imprescritibilidade.”

8. CONSIDERAÇÕES SOBRE O ACORDO DE NÃO PERSECUÇÃO PENAL

8.1 Aspectos Temporais do ANPP

Embora não seja objeto principal deste parecer, é relevante mencionar que a questão da prescrição tem implicações diretas na análise do pedido de Acordo de Não Persecução Penal formulado pela defesa de Bartolomeu.
O artigo 28-A do Código de Processo Penal, que regula o ANPP, não estabelece prazo prescricional específico para sua aplicação, mas a jurisprudência tem entendido que a proximidade da prescrição pode ser fator relevante na análise da conveniência e oportunidade do acordo.

8.2 Posicionamento Ministerial

O Ministério Público manifestou-se contrariamente ao ANPP, fundamentando sua posição na gravidade da conduta e no fato de já ter ocorrido o recebimento da denúncia. Embora este último argumento tenha sido relativizado pela jurisprudência recente, a questão da prescrição permanece relevante para a análise global do caso.

9. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

9.1 Síntese da Análise Prescricional

Após exaustiva análise dos aspectos legais, jurisprudenciais e doutrinários relacionados à prescrição penal no caso em questão, chegamos às seguintes conclusões:
1. Prazo Prescricional: O crime de peculato-furto, com pena máxima de 12 anos, está sujeito ao prazo prescricional de 16 anos, conforme artigo 109, II, do Código Penal.
2. Causa Interruptiva: O recebimento da denúncia em 06 de maio de 2019 constitui causa interruptiva da prescrição, fazendo com que o prazo de 16 anos recomece a fluir integralmente a partir desta data.
3. Situação Atual: Considerando-se os cenários temporais mais prováveis para a consumação do crime, o processo não se encontra prescrito, havendo ainda prazo considerável até a eventual prescrição.
4. Data da Prescrição: Dependendo da data exata da consumação do crime, a prescrição ocorrerá entre 2032 e 2034, considerando-se que não haja outras causas interruptivas.

9.2 Recomendações Estratégicas

Com base na análise realizada, recomenda-se:
1. Acompanhamento Processual: Manter acompanhamento rigoroso do andamento processual, especialmente quanto a eventuais causas interruptivas da prescrição que possam surgir durante a instrução.
2. Estratégia Defensiva: A questão da prescrição não deve ser o foco principal da estratégia defensiva, considerando-se que o processo não se encontra prescrito e há prazo considerável até a eventual prescrição.
3. Outras Teses Defensivas: Concentrar esforços nas teses de atipicidade da conduta e aplicação do princípio da insignificância, conforme já suscitado na resposta à acusação.
4. Monitoramento Temporal: Estabelecer sistema de monitoramento das datas processuais relevantes para eventual reavaliação da questão prescricional no futuro.

9.3 Considerações Finais

A prescrição penal constitui instituto fundamental do direito penal brasileiro, representando importante garantia contra o exercício abusivo do poder punitivo estatal. No caso em análise, embora o processo não se encontre prescrito, a questão temporal permanece relevante para o planejamento estratégico da defesa.
É importante destacar que a análise prescricional deve ser constantemente reavaliada ao longo do processo, especialmente considerando-se a possibilidade de surgimento de novas causas interruptivas ou suspensivas da prescrição.
A precisão nos cálculos prescricionais é fundamental para a preservação dos direitos fundamentais do acusado e para a correta aplicação da lei penal, devendo ser observada com rigor técnico e científico.

10. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS E NORMATIVAS

10.1 Legislação

BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm
BRASIL. Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del3689.htm
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm

10.2 Doutrina

BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Especial. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: Parte Geral. 22ª ed. Niterói: Impetus, 2020.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 20ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

10.3 Jurisprudência

Superior Tribunal de Justiça. Disponível em: https://www.stj.jus.br
Supremo Tribunal Federal. Disponível em: https://www.stf.jus.br
Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte. Disponível em: https://www.tjrn.jus.br
Data: 08 de julho de 2025